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‘Foi uma grande surpresa, vimos desumanidade’
Angelica Richter
17/03/2025 | 08:53
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FOTO: Divulgação


 O médico infectologista Jean Gorinchteyn atendeu ao convite do prefeito de São Bernardo, Marcelo Lima (Podemos), e assumiu a Secretaria de Saúde do município nos primeiros dias de gestão. Porém, ao contrário do que esperava, uma Saúde istrativamente eficiente, encontrou ‘desumanidade no segmento’, com imensas filas de espera para exames, consultas e cirurgias. Gorinchteyn conversou com o Diário no dia da entrega da Casa de agem Enfermeira Vanessa de Cassia Fontes (8 de março), localizada ao lado do Hospital da Mulher. Na ocasião, o secretário fez um balanço do setor e detalhou as ações tomadas até o momento. 

RAIO X

Nome: Jean Carlo Gorinchteyn
Aniversário: 27/6/1968
Onde nasceu: São Paulo – Capital
Onde mora: São Paulo
Formação: Médico Infectologista
Um lugar: Santos
Time do coração: Corinthians
Alguém que ira: Meu falecido pai
Um livro: Nem só de Caviar Vive o Homem
Uma música: Tarzan Theme, de Phill Collins.
“Cantei muito para os meus filhos dormirem.”
Um filme: Casamento Grego

Como o sr. encontrou a Saúde de São Bernardo e qual era sua expectativa? 

Para mim foi uma grande surpresa. Sempre ouvi muito bem da estrutura de São Bernardo, até porque eu era secretário fiscal da Saúde. Então, até brincava, ‘acho que vou encontrar as coisas tão redondinhas que ‘vou ter de pintar a parede, para ter o que fazer’. Mentira. Mal sabia que tinha 72.600 pacientes (nas filas) e veja bem, precisávamos entrar com celeridade. Foi aí que nós levamos esse número para o prefeito Marcelo Lima, que determinou que zerássemos essa fila até dia 1º de julho. Encontramos muita coisa. Então, isso mostra a importância de ter prefeito que olha as pessoas como pessoas e, dessa maneira, se sensibiliza, se solidariza com elas. Por isso, quando ele diz que vamos zerar até o dia 1º não é eleitoreiro, pelo quanto a gente viu de desumanidade nesse segmento. Então, estamos muito felizes por estar fazendo as coisas. É óbvio que ainda tem muito para fazer.

O sr. acredita que o prazo de até 1º de julho será suficiente para zerar as filas? 

Olha, vou contar um segredo para vocês. A gente quer correr para (finalizar) antes, mas que o prefeito não saiba.

Quais gargalos encontrou na Saúde? 

Veja bem, você não está esperando vaga na companhia aérea. Você está esperando vaga no hospital, para fazer exame, para ar por avaliação. Era essa a realidade. Bom, eu não poderia comprometer o meu sistema de saúde. Ou seja, se tenho (fila para) tomografia, ressonância, angioscopia e colonoscopia, não teria como colocar nos nossos sistemas de saúde. Acomodar essa demanda sem comprometer o serviço de pronto atendimento, de novas cirurgias, de pacientes que já estavam internados. Tínhamos 670 pessoas na fila da mamografia. Para tomografia havia 2.700 pacientes aguardando. Começamos com a Carreta da Mamografia, que conseguiu fazer mais de 1.500 mamografias até o momento (dia 8 de março). Então, nós conseguimos dar celeridade. Trouxemos uma carreta da tomografia com a possibilidade de realizar mais de 120 exames por dia. Porém, não podíamos deixar de lado a qualidade dos exames, da imagem e dos laudos. Os resultados demoravam 48 horas, 72 horas e vinha, muitas vezes, a imagem sem o laudo. (Além do exame) Conseguimos fazer com que tivessem dois médicos laudando. Era a dupla checagem. Em duas horas, esse exame estava no prontuário do paciente. Quer dizer, exame com qualidade, eficiência e celeridade. Ao mesmo tempo precisávamos fazer ultrassom. Também trouxemos a carretinha do ultrassom. Foram 80 exames por dia. Fizemos, e estamos fazendo hoje tanto tomografia, ultrassom, como consultas. Já foram mais de 18 mil consultas realizadas ( referente até o dia 8).

Aproveitando que estamos aqui ao lado do Hospital da Mulher, no ano ado houve algumas ocorrências, alguns casos de negligência médica que chegaram ao público e que tiveram vários desdobramentos. 

Quando conheci este hospital, pensei: mentira que isso aconteceu aqui. Não pode ser. Este hospital é maravilhoso. Falei que precisávamos fazer deste equipamento o melhor Hospital da Mulher. Entendemos que a primeira coisa que poderíamos fazer por elas, ou naquele primeiro momento, eram realmente as trocas (na diretoria), para que tivéssemos uma assistência de qualidade extrema. Para que casos como os relatados jamais voltem a acontecer em nenhum âmbito, especialmente no cuidado da mulher.

Gostaria que o sr. falasse um pouco mais da avaliação sobre esses casos, como os problemas estão sendo solucionados e como está o atendimento no hospital agora.

Entendemos que precisávamos ter uma diretoria totalmente imparcial e não anuente com essas equipes ou com esses médicos (envolvidos nos casos de negligência). Foi nesse primeiro momento que acabamos trocando a diretoria clínica e a diretora técnica, fazendo com que, dessa maneira, pudéssemos adentrar no hospital, entender, por meio de uma avaliação maior dos prontuários, o que realmente aconteceu. Isso deu um respiro maior e melhor, inclusive, às equipes que entenderam as medidas. Os algozes foram afastados. É claro que todas as avaliações estão sendo feitas. As sindicâncias internas, as apurações, inclusive, do ponto de vista criminal, estão sendo avaliadas. Se identificarmos que realmente houve qualquer ação que colocou essas pacientes, bem como os seus nascituros, em risco, claro, as infringências éticas e disciplinares vão ser tomadas. Estamos aguardando todas essas sindicâncias terminarem. Volto a dizer, a diretoria, bem como essas equipes, já foram afastadas, fazendo com que tenhamos um respiro por parte das pessoas no entorno.

Então, a sindicância interna do hospital continua também? Porque afirmaram que já havia terminado

Continuam sim. Essas sindicâncias acontecem e vêm acontecendo em sigilo. Neste momento existem as oitivas das equipes. Então, não só da equipe médica, que já foi ouvida, mas todas as equipes no entorno. Porque, veja bem, a partir do momento que dissolvemos a diretoria interior, pudemos aportar e entender que mais questionamentos poderiam e deveriam ser feitos.

Muitas mulheres ainda estão com medo de usar o hospital devido às ocorrências.

Sobre isso... Bom, a primeira questão é que ficamos, como médicos, como maridos, como seres humanos e como gestor, indignados. Quer dizer, são coisas que não podem acontecer. O pior de tudo, enquanto essas avaliações estavam acontecendo, as sindicâncias acontecendo, essas equipes continuavam atendendo e com risco de novos casos. O pior é que não foram só riscos, foram novas ocorrências. Volto a dizer, a diretoria, bem como essas equipes, já foram afastadas. Vamos resgatar e trazer (a confiança), porque estamos falando de dignidade para a mulher, do respeito. Não podemos ter violência obstétrica. Não podemos ter nenhuma condição que traga agravo à saúde dessas mulheres, que têm o direito de ser cuidadas. É um dever do município acolhê-las da melhor forma.

Falando de violência, mas agora da física, e como estamos no mês da Mulher, foi inaugurada a Casa de agem Enfermeira Vanessa de Cassia Fontes. Como funciona o serviço e no que impacta?

A primeira questão é que o município precisa ter um acolhimento para as mulheres vítimas de violência, seja sexual ou física, de agressão. Essas vítimas necessitam de um centro onde sejam acolhidas de uma forma única. A violência é um episódio extremamente traumático para essas mulheres, e cada vez que se fala a respeito disso, se torna algo muito doloroso e não queremos essa revisitação. Por isso, a importância da assistência. São dois consultórios voltados para o acolhimento dessas mulheres, que são trazidas para cá de todos os locais do município, seja por familiares, seja por profissionais da Polícia Militar ou da Polícia Municipal. O acolhimento é feito por mulheres médicas, enfermeiras, psicólogas, assistentes sociais e uma policial municipal, que também trajará sobre as suas vestes um avental. A mulher participará da oitiva, sobre o que aconteceu, como aconteceu, quando foi, com quem foi, se foi a primeira vez. A coleta de todas essas informações será feita uma vez só. Ela não precisará recorrer ao sofrimento. Outro grande problema que vimos é que se a violência acontecesse durante a noite ou de madrugada nossos abrigos estariam fechados e essas mulheres sempre acabavam dormindo nas viaturas ou nas delegacias, porque elas não podiam retomar para as suas casas. Muitos dos agressores eram seus parceiros, cônjuges e não podiam estar ali. Muitas saíam com seus filhos. Para onde iriam? Acabavam sendo acolhidas dessa maneira desumana. Foi aí que surgiu a casa de agem. Porém, essa mulher tem de ser acolhida na plenitude. Por isso, o convite ao Ministério Público, por meio da promotora Tatiana Bicudo, para estar presente conosco, bem com à Faculdade de Direito de São Bernardo, por meio da diretora Priscilla Simonato. Nos sentamos para fazer uma linha de cuidado, que se prolonga além dessa questão do acolhimento. A mulher é levada a um abrigo, para que tenha toda a segurança, mas que também tenha o apoio jurídico subsequente, com advogados e todos os atores que possam assegurar todos os direitos dela como mulher. Então, é dessa maneira, com um olhar mais amplo, que essa mulher é vista como uma cidadã que tem o direito de ser respeitada e ter a sua dignidade valorizada.

Como está o relacionamento com os governos do Estado e federal? 

Os relacionamentos estão excelentes, tanto com a ministra que veio à cidade (Nísia Andrade) quanto com o novo ministro da Saúde (Alexandre Padilha). Somos infectologistas, contemporâneos, sem dúvida alguma temos uma proximidade muito grande. O mesmo temos com a Secretaria Estadual da Saúde, que nos ajudou muito em relação à covid e nos mandou cerca de R$ 2 milhões.(Colaborou Thainá Lana)




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